Haddad poupa Galípolo de mão pesada no juro
Por Rosa Riscala e Mariana Ciscato*
[25/06/25]
… Powell volta ao Congresso americano hoje para falar no Senado (11h), após ter reafirmado na Câmara que o Fed não precisa ter pressa para reduzir os juros. Deve repetir a mesma mensagem de cautela, que reforçou as apostas no primeiro corte apenas em setembro. O cessar-fogo nos conflitos entre Israel e o Irã ajuda a distender as tensões, mas informações de que os ataques às instalações iranianas não destruíram as ambições nucleares dos aiatolás mantêm a tensão na região. Aqui, a ata do Copom não abriu espaço para especulações, mantendo o alerta hawkish, que projeta a Selic a 15% por muito tempo. A agenda de indicadores é mais fraca, com vendas de casas novas nos EUA (11h) e transações correntes no Brasil (8h30). Mas tem leilão duplo no câmbio e a repercussão de uma entrevista de Haddad.
… Em férias quando o Copom decidiu por mais uma alta do juro na semana passada, o ministro da Fazenda comentou, ontem à noite, na Record News que está “preocupado, evidentemente, com a taxa muito restritiva e muito acima da inflação projetada”.
… Mas defendeu Galípolo, assumindo os argumentos do PT, que a alta foi contratada na gestão anterior, de Roberto Campos Neto.
… “Essa alta, sendo muito honesto, quem é do ramo sabe, foi contratada na última reunião do Roberto Campos. É como uma contratação futura da taxa. Não dá pra dar cavalo de pau em política monetária, vai perder credibilidade. Tem que ter muita cautela.”
… E prosseguiu na defesa do presidente do Banco Central indicado por Lula: “Estamos em um começo de um mandato [de Galípolo], que carrega a memória do anterior [Campos Neto]. Ainda precisamos dar um pouco de tempo ao tempo”.
… O ministro também defendeu o aumento do IOF, afirmando que “várias instituições financeiras começaram a driblar o Imposto sobre Operações Financeiras e o governo fechou a porta, dizendo: Olha, não pode. Tudo tem que estar regido pela mesma regra”.
… Haddad insistiu no argumento de que não está aumentando a carga tributária e nessas respostas mostrou muita irritação.
… “A pergunta que tem que acender uma luz na cabeça de todo mundo é: para quem está aumentando? Se eu estou aumentando a carga tributária de quem não paga nada e é rico, eu não estou aumentando a carga tributária.”
… Citou várias vezes o morador da cobertura e os ricos que não pagam imposto.
… Questionado sobre as resistências do Congresso à MP 1.303/2025, que apresenta alternativas de arrecadação, o ministro demonstrou confiança de que será aprovada. “Mediante negociação, nós temos aprovado praticamente todas as medidas.”
… Sobre gastos do governo, Haddad disse que o debate “está congelado até o País encontrar o caminho da sustentabilidade”.
… “Nenhum gasto é bem-vindo, a não ser os imprescindíveis. Se formos parcimoniosos, prudentes nas despesas públicas, teremos mais crescimento. Hoje, temos que ser muito cautelosos. O Brasil tem chance de entrar num ciclo virtuoso.”
… Haddad também defendeu o aumento da oferta de crédito imobiliário para a classe média, revelando que o governo está dando os retoques finais em “um novo instrumento com garantia, para que o juro seja baixo e possamos alavancar essa indústria”.
… “É uma ideia muito interessante que vem sendo gestada há muitos meses com o BC, o Ministério das Cidades e a Caixa.”
… Nesta 3ªF, Haddad e Galípolo participaram de uma reunião de Lula com o presidente da Caixa, Carlos Vieira, para discutir justamente alternativas que garantam o funding do financiamento imobiliário, diante da escassez de recursos da caderneta de poupança.
… O foco é aprimorar a linha de crédito imobiliário corrigida pelo IPCA, uma modalidade lançada em 2019, mas que não deslanchou nos anos seguintes, porque os picos de inflação aumentaram bruscamente as parcelas dos mutuários, gerando inadimplência.
… A ideia, agora, é estruturar um mecanismo que permita transferir aumentos no IPCA para o saldo devedor do empréstimo.
NEM ISSO – Apesar do discurso de austeridade de Haddad, o governo Lula já recuou em uma medida de corte de gastos na MP que prevê alternativas ao IOF, estendendo de 30 dias para 60 dias o limite para concessão do auxílio-doença sem perícia médica (Atestmed).
… Essa limitação no prazo geraria economia de R$ 1,2 bilhão em 2024 e R$ 2,6 bilhões em 2025. O novo impacto não foi ainda estimado.
TENSÃO EM STAND BY – No fim da noite, o barril do petróleo subia perto de 1,50%, após o tombo de quase 13% nos dois últimos pregões com o cessar-fogo no Oriente Médio. O start para a correção vem de dúvidas se o programa nuclear do Irã foi destruído.
… Relatório preliminar da inteligência dos EUA constata que os ataques do exército americano a três instalações nucleares iranianas, no último sábado, apenas atrasaram em alguns meses as ambições nucleares de Teerã.
… O documento confronta a versão de Trump de que esta batalha já estava vencida e fica mais difícil acreditar em uma paz duradoura. No cenário de instabilidade, o cessar-fogo também parece representar um alívio frágil.
… O enviado especial de Trump para o Oriente Médio, Steve Witkoff, garantiu, porém, que os EUA e o Irã já estão em discussões iniciais sobre a retomada das negociações do programa nuclear iraniano.
… “As conversas são promissoras. Estamos esperançosos”, afirmou, em uma entrevista à Fox News.
LEILÃO DUPLO NO CÂMBIO – O BC realizará uma intervenção dupla no câmbio (9h30), com o leilão de venda de US$ 1 bilhão no segmento spot e oferta de 20 mil contratos de swap cambial reverso (equivalente a US$ 1 bilhão), que, na prática, significa compra de dólar futuro.
… A atuação estaria relacionada a um fluxo pontual de saída de estrangeiros, comum em fim de semestre, que tem pressionado o cupom cambial, em ambiente de baixa liquidez – o que, segundo traders, teria explicado a alta do dólar, nesta 3ªF.
… A correção repentina no câmbio no meio da tarde de ontem, portanto, quando o dólar deixou as mínimas e virou para alta, contrariando a onda de queda externa, teve pouco ou nada a ver com o tombo do petróleo.
… O gatilho, de caráter técnico, foi atribuído principalmente aos preparativos para o leilão conjugado e simultâneo (spot + swap reverso) de hoje, o “casadão”, no jargão do mercado, que o BC chamou para prevenir o estresse no cupom cambial.
… A atuação é uma tentativa de evitar qualquer disfuncionalidade por conta da fuga sazonal de recurso estrangeiro nesta época do ano em que há uma natural adaptação de carteiras, devido à virada para o segundo semestre.
… Primeiro, nesta 3ªF, o dólar à vista cumpriu os prognósticos de que furaria R$ 5,50 com o cessar-fogo. Bateu R$ 5,4759 no piso do dia, com o movimento acentuado pela interpretação de mais dois cortes do Fed este ano.
… Só depois de liquidado este ajuste às novidades do dia foi que a moeda americana então passou a subir, fechando em alta de 0,29%, em R$ 5,5189. A perspectiva para o real, porém, segue positiva, garantida pelo carry trade com a Selic a 15% por muito tempo.
MAIS AGENDA – O mercado espera um déficit de US$ 3,1 bilhões nas transações correntes em maio (mediana do Broadcast), após o saldo negativo de US$ 1,347 bilhão em abril. O resultado só não será pior em função do bom comportamento da balança comercial.
… Para o Investimento Direto no País (IDP), a mediana indica entrada líquida de US$ 4,5 bilhões em maio, resultado que deve ficar abaixo do saldo positivo de abril (US$ 5,491 bilhões). As expectativas vão de US$ 3,9 bilhões a US$ 5,9 bilhões. Os dados saem às 8h30.
… No início da tarde (14h30), o Banco Central divulgará os números semanais do fluxo cambial.
LULA – O presidente participa hoje de reunião do CNPE (9h30), que pode decidir o aumento da mistura do etanol na gasolina, de 27% para 30%. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também estará presente.
NOS EUA – As vendas de moradias novas (11h) podem registrar um tombo de 6,5% em maio, após a expansão de 10,9% em abril (11h). Já as 11h30, o DoE informará os estoques de petróleo na semana até dia 20 de junho.
A ATA NÃO VACILOU – Respeitando a adoção da estratégia “high for longer” do BC, pesquisa Broadcast apontou que a ampla maioria do mercado financeiro (32 de 37 casas consultadas) projeta a Selic engessada em 15% pelo menos até o final deste ano.
… Apenas uma parcela isolada (5 instituições) estima janela para retomada do afrouxamento monetário ainda este ano, entre novembro e dezembro. Dias atrás, o DI andou especulando sobre a chance de o juro já cair em janeiro.
… É esse o desafio do BC: continuar muito hawkish na comunicação, segurar as apostas de corte antecipado e ancorar as expectativas.
… Ontem, foi a melhora na percepção de risco global, com o cessar-fogo entre Israel e o Irã, que tirou prêmio da curva do DI, com exceção da ponta longa.
… No fechamento, o contrato para Jan/26 marcava 14,950% (de 14,962% no dia anterior); Jan/27, 14,215% (de 14,269%); e Jan/29, a 13,370% (de 13,390%). Jan/31 subiu a 13,550% (13,519%); e Jan/33, 13,650% (13,605%).
A PRESSA É INIMIGA DA PERFEIÇÃO – Em NY, momentaneamente, alguns agentes do mercado observaram um viés um pouco mais dovish na mensagem de Powell, quando ele reconheceu a chance de as tarifas virem mais brandas.
… “Podemos ver a inflação não tão forte quanto o esperado. Se for esse o caso, sugerimos cortar mais cedo”, foi o que ele disse, para depois complementar que as projeções do Fed são de alta da inflação por causa do tarifaço.
… Segundo Powell, a política protecionista do governo Trump deve começar a ser repassada para os preços a partir de agora, entre junho e julho, o que joga os holofotes sobre os próximos indicadores da inflação norte-americana.
… Ainda assim, afirmou, a maioria significativa dos formuladores de política monetária acha apropriado cortar o juro ainda este ano. Ao longo do pregão, o mercado desistiu do primeiro corte em julho e voltou a projetar setembro.
… Na plataforma FedWatch (CME), a aposta para setembro é amplamente majoritária (81%), contra 18,6% de julho. Powell esvaziou a lebre levantada por Christopher Waller e Michelle Bowman de um desaperto já mês que vem.
… Mas a perspectiva de ainda dois cortes do juro neste ano e o alívio com o cessar-fogo enfraqueceram o dólar.
… O índice DXY – que mede o desempenho da moeda dos EUA contra uma cesta de seis divisas fortes – furou o piso dos 98,000 pontos, com mínima de 97,707 pontos, e já acumula queda de mais de 1,50% nesta semana.
… Na mesma onda, as taxas dos Treasuries recuaram: Note de 2 anos a 3,816% (contra 3,847% na véspera) e de 10 anos a 4,297% (de 4,335%). NY observou o impacto deflacionário da nova derrocada registrada pelo petróleo ontem.
… Vindo de uma espiral de queda de quase 7% na véspera, o contrato do tipo Brent com vencimento em agosto derreteu mais 6,07% ontem e perdeu o nível dos US$ 70, negociado no fechamento dos negócios a US$ 67,14.
… A afundada cobrou, de novo, o seu preço da Petrobras: ON recuou 2,09% (R$ 34,17) e PN, -1,97% (R$ 31,37). Vale operou sem fôlego, praticamente estável (-0,02%, R$ 50,54), mas o Ibovespa conseguiu pegar o embalo externo.
… Entre as blue chips, a tração veio dos bancos, ignorando a ata hawkish do BC: Bradesco ON (+0,49%; R$ 14,26), Bradesco PN (+0,30%; R$ 16,54), Itaú (+1,89%; R$ 37,25), Santander (+1,82%; R$ 29,65) e BB (+1,66%; R$ 21,44).
… Mesmo com o cessar-fogo violado tanto por Israel como pelo Irã, as bolsas em Wall Street apostaram nos sinais de pacificação da “guerra de 12 dias” e ainda tiveram a garantia de Powell de pelo menos dois cortes de juro este ano.
… O Dow Jones completou o seu terceiro pregão consecutivo em terreno positivo. Subiu 1,19%, aos 43.089,02 pontos. O S&P 500 avançou 1,11%, aos 6.092,18 pontos, e o Nasdaq fechou em alta de 1,43%, aos 19.912,53 pontos.
EM TEMPO… EMBRAER inaugurou ontem novas instalações de serviços de manutenção, reparo e revisão para aviação comercial em um aeroporto no Texas, nos EUA, com investimento aproximado de US$ 70 milhões.
MULTIPLAN aprovou a distribuição de R$ 120 milhões em JCP, o equivalente a R$ 0,2456 por ação, com pagamento até 30/6/26; ex em 30/6/25…
… Companhia também aprovou novo programa de recompra de até 10 milhões de ações.
LOCALIZA aprovou a distribuição de R$ 533,8 milhões em JCP, o equivalente a R$ 0,5061 por ação, com pagamento em 19/8; ex em 30/6.
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